FOLHA DE S. PAULO – BRASIL
Tribunal de Justiça anula julgamento do caso Dorothy
Justiça anula absolvição de fazendeiro do caso Dorothy
Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, é acusado de ser mandante do crime contra a freira
Tribunal de Justiça do Pará manda prender Bida até que novo julgamento seja feito; defesa diz que pedirá habeas corpus e que vai recorrer
O Tribunal de Justiça do Pará anulou ontem a decisão do júri que, há quase um ano, absolveu o fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, da acusação de ser um dos mandantes do assassinato, em 2005, da missionária norte-americana naturalizada brasileira Dorothy Stang.
Os desembargadores também mandaram prender imediatamente o fazendeiro até que um novo julgamento seja realizado. Até o final desta edição, a prisão não havia ocorrido, segundo a Secretaria Estadual da Segurança Pública.
O acórdão do tribunal acatou um recurso do Ministério Público do Pará, segundo o qual a conclusão dos jurados, em maio do ano passado, foi contrária aos depoimentos dados por envolvidos no assassinato, que incriminaram Bida.
Um desses testemunhos aconteceu em maio de 2007, quando Amair Feijoli da Cunha, o Tato, que já foi condenado a 17 anos de prisão por ter intermediado o contato com os pistoleiros que mataram a missionária, disse que foi Bida quem encomendou a morte, pela qual teria pago R$ 50 mil. Tato fez essa declaração sob o regime de delação premiada.
O que reforçou a importância das provas testemunhais foi o fato de o tribunal considerar sem validade um vídeo apresentado ao júri que absolveu Bida, em 2008, no qual o mesmo Tato afirma que o fazendeiro é inocente. Segundo o promotor Edson de Souza, responsável pela acusação, essa foi a principal prova da defesa.
O tribunal acatou o argumento de Souza, para quem a gravação foi anexada aos autos do processo de maneira irregular, sem que o promotor nem o juiz que conduziu o júri tivessem conhecimento dessa evidência, o que os impediu de contestá-la.
O promotor também disse que houve "negociação" financeira para que Tato voltasse atrás em seu depoimento.
O advogado de Bida, Eduardo Imbiriba, negou isso. Também afirmou que a gravação foi anexada dentro dos prazos legais e que ela não é a principal prova da inocência de seu cliente.
Imbiriba disse que entrará com um pedido de habeas corpus na próxima semana e que contestará a decisão dos desembargadores por meio de recursos em instâncias superiores.
Rayfran das Neves, que assumiu ter atirado em Dorothy e foi condenado a 28 anos de prisão no mesmo júri que absolveu Bida, também teve sua sentença suspensa pela decisão de ontem do TJ-PA. Isso porque sua pena não levou em conta o agravante de ele ter recebido dinheiro para cometer o assassinato, resultado direto dos jurados terem considerado que não houve mandante para o crime contra a missionária.
Ele deve continuar preso até um novo júri ser marcado.
Histórico
Dorothy foi morta com seis tiros em fevereiro de 2005, em uma estrada de terra de Anapu (750 km de Belém). Tinha 73 anos. Ela era defensora dos pequenos produtores rurais e havia feito denúncias contra fazendeiros da região por grilagem de terras e desmatamento ilegal, razão pela qual era constantemente ameaçada.
Sua morte provocou comoção internacional e é apontada como um dos marcos do conflito agrário brasileiro. No ano passado, um filme sobre o assassinato -"Mataram a Irmã Dorothy", do americano Daniel Junge- chegou a ser pré-selecionado para o Oscar de melhor documentário deste ano, mas acabou não sendo indicado.
Todos os denunciados pela morte já foram a julgamento, exceto o outro suposto mandante, Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão, preso no ano passado sob a suspeita de voltar a grilar terras na região, mas que hoje está em liberdade. Seu julgamento deve acontecer até o final de junho, segundo o TJ.
Para José Batista, advogado da CPT (Comissão Pastoral da Terra), entidade da qual a religiosa fazia parte, a decisão de ontem é um "passo importante" para acabar com a impunidade. No entanto, ele evitou comemorá-la, dada a possibilidade de a decisão ser reformada.
FOLHA DE S. PAULO - BRASIL
Defesa diz não haver motivo para prisão
outro lado
Eduardo Imbiriba, advogado de Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, disse que seu cliente é inocente e que entrará com recursos para reverter a decisão do Tribunal de Justiça do Pará, que anulou o júri do ano passado, no qual o fazendeiro foi inocentado da acusação de mandar matar Dorothy Stang.
Segundo Imbiriba, os recursos devem ser protocolados no STJ (Superior Tribunal de Justiça) e no STF (Supremo Tribunal Federal), em Brasília.
Em relação ao mandado de prisão expedido pelos desembargadores, afirmou que na segunda-feira vai entrar com um pedido de habeas corpus no STJ para que Bida seja solto.
Ele disse que já esperava que o TJ reformasse a decisão do júri de 2008 devido a "pressões políticas", "internacionais" e de movimentos sociais. Mas afirmou ter ficado surpreso com a ordem de prisão.
Segundo o advogado, Bida continua sendo inocente até prova em contrário e não há motivo para que volte a ser preso, como esteve de maio de 2007 até maio do ano passado. Por isso, disse, Bida deve ser solto rapidamente.
Em relação ao vídeo, afirmou que ele foi anexado aos autos dentro dos prazos legais e que não foi o principal motivo da absolvição do fazendeiro.
Para Imbiriba, o que levou o júri a considerar o fazendeiro inocente foi a demonstração de que ele não tinha nenhum interesse na morte de Stang.
O advogado disse que Bida está em sua casa, em Altamira (PA), e que não resistirá à prisão nem fugirá. "Até porque isso prejudicaria nossos recursos."
O ESTADO DE S. PAULO – NACIONAL
Tribunal anula julgamento do caso Dorothy e manda prender fazendeiro
Acusado de ser o mandante do crime, Bida, que havia sido absolvido em 2008, será julgado de novo
Justiça do Pará anulou ontem o segundo julgamento do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser o mandante da morte da missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, e também decretou a sua prisão. O Tribunal de Justiça determinou ainda que seja realizado um novo julgamento do pistoleiro Rayfran das Neves Sales, o Fogoió, acusado de matar a freira com seis tiros. O novo júri dos dois acusados deve acontecer no segundo semestre.
Esta é a segunda reviravolta no julgamento dos envolvidos no assassinato da americana. Em 2007, Bida foi condenado a 30 anos de prisão, mas acabou beneficiado pela lei - revogada no ano passado - que mandava a novo júri réus condenados a penas que ultrapassassem 20 anos. No segundo julgamento, no ano passado, o fazendeiro foi absolvido por 5 votos a 2.
A defesa, nesse segundo julgamento, apresentou um novo depoimento, gravado em vídeo, de Amair da Cunha, o Tato - fazendeiro acusado de ter intermediado o contato entre Fogoió e Bida. Da prisão, onde cumpre pena de 18 anos, Tato disse que seu colega fazendeiro não tinha nada a ver com o assassinato.
O promotor Edson Cardoso reagiu, afirmando que o vídeo era uma prova inédita, à qual não tivera acesso e por isso não deveria ser aceita no julgamento. Mas não adiantou: o júri absolveu o fazendeiro.
"A apresentação da prova feriu o princípio constitucional do contraditório", disse Cardoso. "O pior é que esse depoimento foi decisivo para que os sete jurados absolvessem o Bida."
A promotoria recorreu ao TJ do Pará e teve sucesso. Os desembargadores Milton Nobre, revisor do processo, Vânia Silveira, relatora, e Brígida Gonçalves anularam o júri e determinaram a prisão de Bida. O seu defensor, Eduardo Imbiriba, vai recorrer da decisão.
Fogoió está preso numa penitenciária de segurança máxima nos arredores de Belém. Ele foi condenado a 28 anos de prisão, no primeiro dos julgamentos envolvendo o assassinato da religiosa. Irá novamente a júri porque, segundo os desembargadores, naquela ocasião os jurados não levaram em conta a promessa de recompensa - de R$ 50 mil - pela morte da freira.
A promessa, de acordo com a acusação, foi feita pelos fazendeiros Bida e Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão. Este último até hoje aguarda julgamento. O quarto envolvido no crime, Clodoaldo Batista, que acompanhava Fogoió e presenciou o assassinato, cumpre pena de 17 anos.
A desembargadora Vânia Silveira disse, ao justificar seu voto, que a materialidade e a autoria do crime foram comprovadas. Segundo sua argumentação, existem provas de que tanto Bida como Sales "foram os responsáveis pelo homicídio qualificado praticado contra a vítima, a missionária Dorothy Stang, um na qualidade de executor (Sales) e o outro na qualidade de mandante (Bida)."
CRONOLOGIA
12/2/2005 - A religiosa Dorothy Stang é assassinada a tiros, em Anapu, no Pará
11/12/2005 - Rayfran Sales, o Fogoió, que seria autor dos disparos, é condenado a 27 anos de prisão
16/5/2007 - O fazendeiro Vitalmiro Moura, o Bida, apontado como mandante do crime, é condenado a 30 anos
22/10/2007 - Fogoió é submetido a novo julgamento e o tribunal do júri confirma a pena de 30 anos
18/12/2007 - TJ do Pará anula segundo julgamento de Fogoió
6/5/2008 - Bida vai a novo julgamento e é absolvido pelo júri
7/4/2009 - Justiça anula absolvição de Bida e determina novos julgamentos para ele e Fogoió
O ESTADO DE S. PAULO – NACIONAL
''O circo foi desmontado''
Roldão Arruda
O anúncio da decisão do Tribunal de Justiça do Pará, que anulou a sentença do pistoleiro Rayfran Neves Sales, o Fogoió, e a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos Moura, o Bida, foi comemorada por organizações de defesa dos direitos humanos. Na opinião de Mary Cohen, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, no Pará, a resolução "restabelece a credibilidade do Poder Judiciário no Estado".
Segundo a advogada, a absolvição do fazendeiro Bida, após ter sido condenado a 30 anos, provocou indignação no Brasil e no exterior. "O que vimos ali foi uma farsa, um circo, denunciado desde o início pelo Ministério Público e pelos advogados que atuavam na acusação. Agora o circo foi desmontado e se restabeleceu o devido processo legal."
Em relação às dificuldades para se chegar a uma conclusão definitiva no julgamento, a advogada observou que estão ligadas a dois fatores. O primeiro era a lei que determinava um segundo julgamento para réus com sentenças acima de 20 anos. "Era uma excrescência jurídica herdada do século 19, que já foi derrubada."
A segunda dificuldade está relacionada ao tribunal do júri - que, no caso em debate, condenou um réu a 30 anos e o absolveu no espaço de um ano. "Será que o tribunal do júri não está precisando de uma reformulação? Embora, teoricamente, seja a mais democrática, esta forma de julgar não poderia comportar situações tão absurdas."
Os bastidores e reviravoltas do julgamento dos assassinos da religiosa constituem um dos temas do documentário Mataram Irmã Dorothy, que estreia em circuito comercial dia 17, em cinemas de São Paulo, Rio, Brasília e Belém.
CORREIO BRAZILIENSE – BRASIL
Absolvição de Bida anulada
Justiça do Pará entendeu que defesa do agricultor, acusado como um dos mandantes da morte da missonária Dorothy Stang, utilizou uma prova ilegal. Júri que condenou pistoleiro também foi invalidado
O fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado pelo promotor público de ser um dos mandantes do assassinato da missionária Dorothy Stang, será julgado pela terceira vez. O Tribunal de Justiça do Pará anulou ontem o segundo julgamento — realizado no ano passado e que absolveu o pecuarista. A freira foi executada por dois pistoleiros em fevereiro de 2005, na área rural de Anapu, no sudeste do Pará. Os desembargadores do tribunal também determinaram a prisão imediata de Bida, que deverá retornar à penitenciária estadual em Americana, no interior do estado.
Na mesma sessão, o tribunal também anulou o júri que condenou a 27 anos de prisão o pistoleiro Rayfran das Neves, o Fogoió, autor dos seis disparos que mataram a religiosa. Os desembargadores concluíram que os jurados não levaram em consideração o agravante de que Rayfran teria executado a missionária com a promessa de recompensa financeira feita por Bida. Na ocasião, os promotores não conseguiram provar essa tese. Com a anulação do julgamento do principal pistoleiro da morte da missionária, a expectativa da promotoria é de que a pena dele seja aumentada. Os advogados de defesa de Bida e Rayfran informaram que vão recorrer da decisão de ontem ao Superior Tribunal de Justiça(STJ) com um pedido de habeas corpus.
No caso de Bida, os três desembargadores da turma que decidiu anular o julgamento entenderam que a defesa do pecuarista utilizou uma prova ilegal ao exibir um vídeo com um depoimento de um cúmplice que o inocenta. Além disso, a prova foi incluída nos autos sem o conhecimento do juiz e do Ministério Público. Os outros envolvidos no caso, Clodoaldo Carlos Batista, que estava com Rayfran quando o pistoleiro executou a missionária, e Amair Feijoli, conhecido como Tato e responsável pela contratação dos pistoleiros, continuam presos cumprindo penas de 18 anos.
Grilagem
O quinto envolvido na morte da missionária, o fazendeiro Regivaldo Galvão, o Taradão, deve ter seu primeiro julgamento como mandante da execução da freira marcado para fim de junho, segundo expectativa do promotor Edson Cardoso de Souza. Conhecido como Taradão, o pecuarista chegou a ficar um ano preso em Belém, mas foi libertado por um habeas corpus. Solto, no início deste ano voltou a tentar reaver o lote 55 onde a missionária tentava implantar o Projeto de Desenvolvimento Social (PDS), um modelo coletivista de reforma agrária.
Regivaldo terminou preso pela Polícia Federal depois de ser denunciado pelo Ministério Público por tentativa de grilagem de terra pública e falsificação de documentos. O pecuarista chegou a participar de uma reunião na superintendência de Altamira do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), quando informou que estava novamente interessado em ocupar novamente o lote 55 em troca de um acordo de convivência com os posseiros do PDS. Regivaldo responde aos dois processos — um na Justiça estadual e outro na federal — em liberdade.
O GLOBO – PAÍS
Justiça anula julgamentos do caso Dorothy Stang
Vitalmiro Moura, que havia sido inocentado da acusação de mandar matar missionária, voltará ao banco dos réus
O Tribunal de Justiça do Pará anulou ontem o julgamento que absolveu, em maio do ano passado, Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser um dos mandantes do assassinato da missionária americana Dorothy Stang, executada a tiros em fevereiro de 2005. Na mesma sessão, os desembargadores anularam o julgamento de Rayfran das Neves Sales, pistoleiro condenado pela morte da freira - sob a alegação de que o júri não levou em consideração o agravante de promessa do pagamento pelo crime. O órgão também votou pela prisão preventiva de Bida, expedida ainda ontem. Ainda não há data para o novo julgamento.
Na decisão, a Câmara Criminal Isolada (órgão especial do TJ), aceitou a apelação do Ministério Público estadual segundo a qual a decisão dos jurados foi contrária às provas nos autos. De acordo com o promotor Edson Cardoso, responsável pela apelação, o principal motivo que levou os jurados a cair em contradição foi a exibição de um vídeo, no dia do julgamento. Nesse vídeo, Clodoaldo Batista, o Tato, também acusado de envolvimento no crime, inocenta Bida.
Essa prova foi mantida em sigilo durante todo o processo, ferindo o princípio do contraditório, já que Ministério Público e o próprio juízo não tiveram acesso ao material.
Recompensa de R$50 mil pelo assassinato
A anulação do julgamento de Bida foi proposta pela relatora do processo, desembargadora Vânia Silveira, que reconheceu "a materialidade e a autoria do crime diante de provas irreputáveis". O voto da relatora foi acompanhado pelos desembargadores Milton Nobre, revisor do recurso, e Brígida Gonçalves (o quarto desembargador faltou à sessão). No caso de Rayfran, a anulação foi deferida diante da "não aceitação da qualificadora de promessa ou paga de recompensa".
Segundo o Ministério Público, o pistoleiro executou a missionária em troca de R$50 mil, prometidos por Bida e pelo fazendeiro Regivaldo Pereira Galvão, o "Taradão". Rayfran foi condenado a 27 anos de prisão. Agora, ele poderá ser condenado a uma pena maior.
O Ministério Público espera que os novos julgamentos sejam realizados este ano. O advogado de Bida, Eduardo Imbiriba, disse que vai recorrer da decisão, em Brasília.
Irmão de Dorothy elogia decisão da Justiça
A decisão da Justiça foi recebida com entusiasmo pelos representantes de entidades que acompanharam o julgamento da apelação, no prédio do TJ. O coordenador do Comitê Dorothy Stang, Dinailson Benassuly, disse que o resultado "traz de volta a esperança de que a Justiça realmente prevaleça". Para ele, o Pará tem a chance de quebrar um estigma que mancha a reputação do estado: não punir mandantes de crimes no campo.
- Além de Bida, também exigimos a punição de Regivaldo, outro responsável pelo crime e que até hoje não sentou no banco dos réus - afirmou.
As irmãs da Congregação de Notre Dame de Namur, a qual pertencia a Dorothy, comunicaram a decisão aos parentes da missionária nos Estados Unidos. Por telefone, David Stang, irmão de Dorothy, disse que ficou feliz com a decisão.
"Crê nos que buscam a verdade. Duvida dos que a encontram." André Gide