FOLHA DE S. PAULO – MERCADO
Ministério Público teme conflito em Belo Monte
Procurador diz que usina comete mesmos erros que levaram à crise em Jirau
Consórcio responsável pela construção não vê inchaço populacional: para empresas, número de migrantes é mínimo
FELIPE LUCHETE
Uma usina hidrelétrica no Norte do país, criticada por ambientalistas, com licença parcial do Ibama e processos na Justiça tentando barrá-la.
A descrição vale para a usina de Jirau, no rio Madeira (RO), onde trabalhadores se revoltaram no canteiro de obras nos últimos dias e os trabalhos foram paralisados.
Mas também vale para a hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu (PA), cujas primeiras obras foram anunciadas há duas semanas.
Para o procurador Felício Pontes Júnior, do Ministério Público Federal do Pará, as semelhanças no processo de implantação das usinas mostram que Belo Monte repete os mesmos erros que levaram aos confrontos em Jirau.
Com um agravante: a região de Altamira, que receberá a nova usina, já passa por conflitos agrários graves, como o que levou à morte da missionária Dorothy Stang.
Ela foi assassinada há seis anos em Anapu, um dos cinco municípios que serão diretamente afetados por Belo Monte. Quando concluída, a hidrelétrica pode se tornar a terceira maior do mundo.
Pontes diz que esses conflitos podem se intensificar com a chegada de migrantes à região em um número "incompatível" com a infraestrutura existente no local.
O Ibama estima a migração de 3.000 a 15 mil pessoas nos primeiros oito meses do empreendimento.
Nas usinas de Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, havia 37 mil trabalhadores morando em alojamentos.
OUTRO LADO
O consórcio Norte Energia, responsável pela construção de Belo Monte, discorda da projeção sobre migrantes: aponta que só 167 pessoas dos 11 mil cadastrados em Altamira para trabalhar na obra não eram da região.
Questionada se os confrontos em Jirau mudam os planos de Belo Monte, o grupo diz que não se posiciona sobre hipótese futura.
Em um parecer de outubro de 2010, o Ibama diz que a Norte Energia subestimava o fluxo migratório. O instituto já citava Jirau, que fez a população de um dos distritos de Porto Velho, com estrutura defasada, subir de 4.000 para 15 mil moradores.
O Ibama foi procurado, mas não respondeu.
Entre as condições impostas pelo Ibama para Belo Monte, estão capacitação de moradores da região e investimento em saneamento.
Antes que todas fossem concluídas, porém, o Ibama concedeu licença parcial, como fez em Jirau. Para o Ministério Público Federal, que foi à Justiça contra a iniciativa, ainda não há garantia dos itens de infraestrutura.
A Justiça chegou a conceder liminar contra a licença especial, mas a decisão foi derrubada pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região.
"Quando caiu a liminar, dissemos que a decisão era carta branca para o caos", diz o procurador Felício Pontes. "Com os eventos de Jirau, isso apenas se confirma."
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