segunda-feira, 10 de dezembro de 2007

AGÊNCIA BRASIL


Relatório da Secretaria Especial dos Direitos Humanos revela como a maioria dos conselhos tutelares do Brasil sofre com insuficiência de condições básicas de trabalho. Três em cada 10 sequer têm papel



Em Abaetetuba (PA), barbárie com adolescente presa junto com homens forçou melhorias no Conselho

O conselho tutelar de Abaetetuba, no Pará, que denunciou o caso da menina de 16 anos presa com homens numa cela da delegacia local, conseguiu melhorias nas condições de funcionamento após o episódio. Computador, ventiladores, cota mensal para combustível e linhas telefônicas são alguns dos itens previstos no termo de ajuste firmado entre o Ministério Público do Pará e o governo municipal. A penúria que motivou os promotores a pressionar a prefeitura no sentido de equipar o órgão, entretanto, não é exclusividade de Abaetetuba. Um diagnóstico apresentado pela
Secretaria Especial dos Direitos Humanos (Sedh) esta semana mostra que a maioria dos conselhos tutelares do Brasil funcionam precariamente.

A falta de um espaço permanente, que atinge 12% dos 4.880 conselhos tutelares existentes no país, é o primeiro entrave. São 15% sem mobiliário básico, como cadeira e mesa, e 24% não têm sequer papel. Cópia das leis que deveriam ser o principal instrumento de trabalho dos conselhos - inclusive o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente - é inexistente em 30% deles. Os piores índices estão nas regiões Norte e Nordeste, ao contrário do Sul, que apresenta os melhores indicadores.

O problema de infra-estrutura, segundo
Carmen Oliveira, subsecretária de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente da Sedh, precisa ser combatido porque atrapalha a percepção dos problemas regionais. "A carência de condições básicas de trabalho dos conselhos acaba tendo uma ressonância muito grande na própria qualidade do atendimento à população e também nas informações que precisamos para compor nosso banco de dados e, a partir disso, formular as políticas", destaca.

Carmen ressalva, no entanto, que o modelo de conselho tutelar brasileiro - composto por pessoas da sociedade civil escolhidas por meio de eleição - é único no mundo e precisa de tempo para se aprimorar. "Embora o levantamento aponte muitos pontos negativos, acho que a tendência é que esses órgãos se fortaleçam daqui para frente, visto que se trata de uma política inédita, implantada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente há 17 anos. Sabemos que políticas dessa natureza levam pelo menos 30 anos para se solidificarem", afirma a subsecretária.

Artigos de luxo
Em órgãos que carecem de folhas de papel para desenvolver seu trabalho, linha telefônica e internet soam como verdadeiros luxos. Quase 40% dos conselhos tutelares no Brasil não têm um aparelho de telefone. E 32% trabalham sem computador. Dos 78% que dispõem do equipamento, no entanto, só 28% têm acesso a internet. A falta de um carro atinge 39% dos conselhos. Caso de Santo Antonio do Acaranguá, no interior de São Paulo. "Sem um veículo para nos deslocarmos, fica muito limitada nossa atuação", reclama Nilton Cardoso, conselheiro do município.

Para Rubens Lopes do Nascimento, conselheiro de Campina Grande, na Paraíba, o problema está na dependência dos conselhos tutelares, que são custeados pelos governos municipais. "Veja que a nossa atribuição é fiscalizar o Executivo nas violações dos direitos da criança e do adolescente, mas é o próprio Executivo que pode, ou não, equipar o conselho, dar condições favoráveis de trabalho. Temos aí um paradoxo, porque o fiscalizado é quem mantém o fiscalizador. Quando o prefeito é consciente, investe. Quando não é, fica difícil", diz o conselheiro.

O nível de escolaridade e envolvimento com o tema da infância e adolescência por parte dos conselheiros tutelares foi outro ponto abordado na pesquisa apresentada pela Sedh. Verificou-se que 70% têm ensino médio completo ou menos que isso. Cerca de 15% fizeram um curso de nível superior. O percentual, embora pequeno, é fruto da obrigatoriedade, em alguns municípios, do diploma para se candidatar ao cargo de conselheiro.

Um dos locais onde essa condição existe é Campo Mourão, no Paraná. Conselheiro de lá, Luciano Antonio da Rosa acha que a iniciativa de exigir a formação superior contribui para a melhoria dos serviços prestados. "Não que seja determinante, mas acaba dando mais respeito ao conselheiro na hora de fazer as reivindicações", afirma. A Sedh fechou, este ano, parcerias com universidades e institutos para fornecer treinamento adequado aos conselheiros. "As aulas devem começar no ano que vem. A idéia é dotar essas pessoas de mais informação e instrumentos para executarem suas tarefas", explica Carmen Oliveira.

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